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E se fosse para planta? Uma abordagem Multiespécie

PRJ087 | Contexto da disciplina

No segundo semestre de 2021, as possibilidades de projetos multiespécies estavam sendo discutidas pela pesquisa Jardins Possíveis.   Os alunos dos cursos de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG foram convidados a problematizar a forma em que pensam os espaços da cidade e propor uma cidade para todos “humanos e não-humanos” a partir da disciplina de tópicos em Arquitetura e Urbanismo –   ministrada pela professora Luciana Souza Bragança. 

E se fosse para planta? A partir dessa pergunta disparadora a disciplina propôs aos alunos projetar espaços para as plantas nas cidades. A arquitetura, tradicionalmente, projeta espaços para os seus clientes humanos. Todavia, esse recorte unicamente antropocentrado das discussões disciplinares vem impactando nosso ambiente de maneira a transformá-lo. A questão central nessa proposta é entender que para se pensar em sustentabilidade e ecologia é preciso  mudar essa percepção antropocêntrica. Assim o exercício proposto desloca os alunos, futuros arquitetos, para propor espaços para outros seres vivos: as plantas. Essa disciplina é um desdobramento da pesquisa Jardins Possíveis e da disciplina PRJ087- Como Pensar a Natureza na cidade? uma abordagem multiespécie.  

A experiência foi baseada nas conclusões da Pesquisa Jardins Possíveis entendendo os possíveis revelados em campo pelos jardins descobertos. De humanos a não-humanos, separados ontologicamente pela ideia moderna de natureza, à amigos. Esse foi o possível que os jardins trouxeram para se pensar os espaços, os territórios, a cidade. A pesquisa pôde fazer ver outros mundos, outros territórios, outros jardins possíveis, jardins microcosmos do infinito esses como um microcosmo da Terra viva, ontologia de mundos relacionais. 

A luz desses jardins foi possível iluminar diferentemente o regime de visibilidade da arquitetura e do urbanismo e ver essas famílias multiespecíficas que se preservam pelo cuidado, amor e amizade, onde as disputas não são primordialmente econômicas, coletivos multiespécies territorializados que sobrevivem nas bordas do capitalismo e do seu planejamento e ocupam um pouco mais de 50% do território estudado. 

Todavia, nossa forma de construir espaços interconectados apenas ao humanismo antropocêntrico ou ao mercado em expansão não é suficiente para esses mundos. É preciso, num ato de resistência, levantar esses possíveis cosmopolíticos da arquitetura e do urbanismo baseados em alianças afetivas e confluências, imanência das possibilidades presentes nos jardins para Cidades Jardins Possíveis. Reativar aquilo de que fomos separados no planejamento e na invisibilização, mas que sobrevive no cotidiano e na memória dos jardins. 

O objetivo da disciplina foi fazer uma provocação e convocação aos estudantes para fazer do espaço a possibilidade concreta de extensão da subjetividade e das formas de alteridade aos outros seres, orgânicos e inorgânicos, que não os humanos.

Seremos capazes de alargar o círculo político e considerar a todos sujeitos e não mais objetos? O que foi realmente colocado em jogo pela disciplina é principalmente a pergunta: é possível se pensar a “cidade para todos” como sinalizado nos jardins?

Como proposta de base foram buscados possíveis caminhos para pensar o que significa resistir enquanto arquitetos e urbanistas diante da chamada crise ecológica que vivemos e quais são os reais aliados nessa busca. Daí, partindo do entendimento da cosmologia dos jardins e do termo cosmopolítica como proposto por Stengers e Latour, foi desenvolvida a possibilidade cosmopolítica dos jardins como ferramentas de entender e de propor Cidades. 

A disciplina foi pensada e proposta como uma hipótese investigativa de como poderiam ser incluídos outros agentes, neste caso as plantas, no processo de projeto e planejamento urbano. A ideia levantada na disciplina é a possibilidade de pensar todos esses agentes a partir de bases espaciais que os levem em consideração não apenas passivamente ou para usufruto dos humanos.

Metodologia

O objetivo geral da disciplina foi pensar todos os agentes da cidade no projeto, construindo outras perguntas. 

EMENTA: E se fosse para planta?

O objetivo da disciplina é pensar a cidade a partir das plantas. A proposta da disciplina é, a partir da pergunta provocadora, entender como seria possível inverter as prioridades nos projetos de arquitetura e urbanismo, trazendo para o centro das questões as plantas. A ideia é pensar estratégias para pensar o espaço a partir da perspectiva da planta.

Ela foi desenvolvida em módulos com objetivo final de propor projetos de espaços para as plantas na cidade.

Os resultados esperados foram projetos que especulassem um modo de pensar a relação entre humanos e não-humanos na produção espacial pensado a partir das plantas. 

Os objetivos específicos foram: estudar a complexidade das relações sócio-espaciais que envolvem um meio a ser modificado por um projeto urbano incluindo o jardim e que trabalha com a ecologia; compreender as relações entre os diversos agentes nas cidades principalmente entre pessoas e plantas; buscar formas de projeto contextualizado nas dinâmicas próprias dentro das necessidades e formas de viver das plantas.

AVALIAÇÕES:

TP1:
Leitura e apresentação dos conceitos chaves em um seminário. Individual. Texto: Capítulos: Arquiplantas e Cosmoplantas. Livro “A revolução das plantas”, Stefano Mancusso.

TP2:
Desenvolvimento intermediário das ideias e apresentação. Discussão.

TP-final:
Apresentação de diretrizes de projeto em seminário. Tempo de apresentação: 20 minutos.

Exercício inicial

Na aula inicial foi apresentada a proposta e foram apresentadas e discutidas as ideias de sustentabilidade, desenvolvimento sustentável, ecologia, natureza e as políticas da e para a ‘natureza’, suas propostas e seus limites. As problematizações foram conduzidas no sentido de iluminar as limitações das formas que são consideradas os outros seres pela arquitetura e o urbanismo e que são direcionadas por esses conceitos. O objetivo de preservar o crescimento econômico e não a vida e as implicações antropocênicas apontadas no capítulo anterior foram muito presentes nas colocações feitas por mim e nas falas dos alunos.

Os alunos foram inicialmente apresentados a essa proposta a partir da Pesquisa Jardins Possíveis e dos capítulos: Arquiplantas e Cosmoplantas do livro “A revolução das plantas” de Stefano Mancusso.  

Houve uma apresentação para toda a turma das reflexões produzidas com a leitura.

Exercício Final

Na segunda parte da disciplina os alunos se juntaram em grupo  para propor um projeto para as plantas.

Resultados

A proposta era de construir uma perspectiva não antropocêntrica dos projetos.

Sem a pretensão de unificação entre os humanos e as plantas, os alunos foram incentivados nas orientações a pensar sobre as decisões espaciais a partir de disputas territoriais de vontades e possibilidades de cada agente e no enredamento desses amigos e dessas disputas muito presentes nos espaços. 

As propostas foram construídas mirando na cosmopolítica espacial possível como uma nova Cidade Jardim numa composição progressiva do mundo em comum a compartilhar e onde a agência de todos está presente.

Projeto dos alunos

Política verde

Trabalho dos alunos: Erika Hashimoto, Marco Faria e Paula Miari

Mata Ciliar

Trabalho dos alunos: André Chaves, Luiza Mendanha e Marcela Almeida

Para plantas

Trabalho dos alunos: Julia Moura, Laryssa Helena, Thiago de Freitas

E se?

Trabalho dos alunos: Julia Moura, Laryssa Helena, Thiago de Freitas

Jardim no São Geraldo

Trabalho dos alunos: Antônio Prado, Augusto Crosara e Bruna Barros

Alun@s

Alice Umbelino Passos

Andre Meira Chaves

Antonio Prado Libanio

Augusto Crosara Vieira

Brenda Rodrigues Barros

Bruna Barros Rodrigues

Erika Kochi Hashimoto

Gabrielle Silva Costa De Araujo

Haroldo Fernandes Viveiros Filho

Julia Moura Costa

Julia Villanova Valadares

Laryssa Helena De Paula

Lucas Geronimo Oliveira Dos Santos

Luiza Born Mendanha

Marcela Almeida De Souza

Marco Antonio Rodrigues Faria

Paula Esteves Miari Brito

Silvia Ramos Dos Santos Souza

Thiago De Freitas Pessoa

Victoria Inez De Carvalho Correa

linguagens técnicas e poéticas

As significações imaginárias e simbólicas sobre o que sejam “cidades mais justas e sustentáveis” são diversas e atravessadas pelos valores instituídos. Para ampliar tais significações é preciso acionar linguagens diversas, oriundas dos campos técnicos e poéticos.

narrativas

Para um mesmo fato, surge mais de uma narrativa que explica/justifica tal fato, ou seja, há muitas figurações que precisam ser expandidas, antes que se faça uma separação precoce do que possa ser falso ou verdadeiro, exato ou figurativo. A partir da diversidade de narrativas, orbitam atores humanos e não-humanos diversos, antagônicos ou não.

cartografia

A cartografia como metodologia assume a pesquisa como dispositivo de intervenção, produtora de acontecimentos abertos à imprevisibilidade da ação.


O movimento alternado do observador-pesquisador, ora em direção ao processo que pretende analisar, ora se afastando dele, desestabiliza a separação entre sujeito e objeto, tornando sujeitos políticos tudo e todos os envolvidos nos processos, com vozes e saberes a serem compartilhados, e, por isso, passíveis de transformação.

assessoria técnica

Várias atividades extensionistas desenvolvidas pelo Natureza Política se aproximam das práticas de Assessoria Técnica, na medida em que demandas socioespaciais são trazidas por moradores e/ou lideranças comunitárias. Contudo, essas demandas são sempre problematizadas, tendo em vista a sua articulação à pesquisa e à produção de uma ciência viva e engajada socialmente, na fricção do erudito e do popular, resultando em um conjunto de técnicas e procedimentos coletivamente acordados, que visa a inclusão social e a justiça ambiental.

giro epistemológico

O chamado “giro espacial” é identificado a partir de uma mudança de ênfase da dimensão temporal para a dimensão espacial da sociedade, mudança esta ocorrida, aproximadamente, a partir do início da década de 1980 em termos da reflexão teórica, mas com raízes concretas que remontam aos movimentos culturais e eco lógicos dos anos 1960-70. O termo “giro decolonial” foi “cunhado originalmente por Nelson Maldonado-Torres em 2005” e “basicamente significa o movimento de resistência teórico e prático, político e epistemológico, à lógica da modernidade/colonialidade.

(HAESBAERT)

práxis instituinte

A única práxis emancipadora é aquela que faz do comum a nova significação do imaginário social. Isso significa também que o comum, […], sempre pressupõe uma instituição aberta para a sua história, […], para tudo aquilo que funcione como o seu inconsciente.

(Dardot&Laval, 2016, p.368)

comum

O comum deve ser pensado como co-atividade (…) somente a atividade prática dos homens pode tornar as coisas comuns (…), pode produzir um novo sujeito coletivo.

Se existe “universalidade”, só pode ser trata-se de uma universalidade prática.

(Dardot&Laval, 2016, p.40)

imaginários radicais

A história é impossível e inconcebível fora da imaginação produtiva ou criadora, do que nós chamamos imaginário radical tal como se manifesta ao mesmo tempo e indissoluvelmente no fazer histórico, e na constituição, antes de qualquer racionalidade explícita, de um universo de significações.

(Castoriadis, 1982, p.176)

emancipação

A emancipação advém tanto da compreensão dos mecanismos de poder e sujeição, quanto da destituição da forma de agência que tais mecanismos pressupõe (…) A emancipação é uma deposição do saber, é uma decomposição da voz e a instauração de uma nova gramática de poder na vida social.


(SAFATLE)

dispositivos

“Um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo”


(Foucault, 2015, p.364)

poder

O poder tem que ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que só funciona em cadeia.


(FOUCAULT)